Trabalho: Direita volta atrás e agora defende benefícios a empregados.
[VALOR ONLINE] Paulo Braga De Santiago
O governo chileno está tentando encurralar a oposição de direita e apresentou no Congresso nesta semana um projeto para reformar o regime que permite às empresas baixar custos com a terceirização de pessoal. Estima-se que 50% da força de trabalho total do Chile seja hoje terceirizada.
A proposta, para ampliar os benefícios a trabalhadores contratados em regime temporário e terceirizados, havia sido apresentada há mais de três anos pelo Executivo. Sofreu diversas emendas e acabou engavetada por resistência dos partidos de direita e de setores do próprio bloco governista.
Agora, o presidente Ricardo Lagos aproveitou o compromisso assumido em campanha pelo candidato da oposição, Sebastián Piñera, de aprovar o projeto, interrompeu o recesso parlamentar e mandou o texto ao Congresso na versão original. O texto foi aprovado ontem por uma comissão parlamentar e pode ser votado hoje.
Usando a sensibilidade política do tema - a precarização dos vínculos trabalhistas é considerada uma das falhas do modelo de desenvolvimento chileno -, Lagos e a candidata do governo à Presidência, Michelle Bachelet, estão dando uma espécie de xeque na direita: rejeitar o projeto pode minar as chances de Piñera no segundo turno deste domingo, ao mesmo tempo em que sua aprovação pode ser "vendida" ao eleitorado como uma vitória do bloco governista.
"Com a exigência de liberdade econômica para fazer o país crescer, tem sido difícil mexer na legislação trabalhista", disse Carmen Espinosa, diretora da ONG Programa de Economia do Trabalho, que defende mais proteção aos trabalhadores. "A estratégia de desenvolvimento do país significou deixar desprotegidos muitos trabalhadores." Ela acredita que o período pré-eleitoral é boa ocasião para que o Legislativo seja pressionado a aprovar uma reforma ao menos parcial do sistema.
A terceirização de mão-de-obra é um fenômeno que se intensificou no Chile no final dos anos 90. Em 2004, cerca de 43% dos trabalhadores do setor privado do país eram terceirizados, contra 32,8% em 1999, segundo o Ministério do Trabalho. No setor público, a terceirização varia entre 10% e 13%, calcula Carmen Espinosa.
A proposta do governo determina que a empresa que subcontrate a outras seja a responsável final pelo cumprimento das leis trabalhistas e de seguridade social, assim como pelo respeito a normas de segurança e higiene. A idéia é acabar com uma espécie de "limbo" jurídico em que caem os funcionários terceirizados em caso de problemas com o empregador.
Outro objetivo do governo é restringir a terceirização a funções que não correspondam à atividade econômica principal da empresa. Hoje até mesmo o Estado subcontrata funcionários, e um exemplo usado pela oposição para atacar a "hipocrisia" da iniciativa oficial é apontar que os bancos públicos possuem funcionários que exercem funções idênticas e são contratados por regimes distintos.
O projeto quer regulamentar empresas que fornecem trabalhadores para tarefas temporárias, como coberturas de férias e de licença maternidade. Hoje, 7% das empresas chilenas utilizam esse tipo de mão-de-obra, cujos contratos não têm respaldo legal. Uma das idéias é proibir que as chamadas Empresas de Serviços Transitórios tenham vinculação societária com as empresas para as quais prestam serviços, para impedir manobras de "falsa terceirização".
"Isso tudo é uma piada, uma chacota, mentira", disse Alvaro Pizarro, chefe da área trabalhista do Instituto Libertad, ligado a Piñera. Ele disse que a oposição não se opõe às mudanças nos regimes de terceirização, mas que há diferenças quanto à regulamentação dos trabalhadores temporários. A intenção de Lagos teria sido colocar tudo em um único pacote para gerar um clima de confrontação em um tema que, segundo ele, merece ser debatido com mais calma.
"Nos últimos dois anos a inflação subiu 6% e o custo de mão-de-obra cresceu 10%. Neste país cada vez é mais caro ter um trabalhador. O que você faz naturalmente é ter o menor numero de funcionários diretos possíveis", disse Pizarro.
Um comentário:
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