Formulismos corporativos? Não, obrigado
Teorias de transformação de negócios movem uma indústria internacional de livros, cursos, DVDs, artigos, podcasts e muita consultoria. Depois deixam mais problemas do que soluções.
Eu detesto os “formulismos corporativos”. A cada década surgem pelo menos três teorias de transformação dos negócios que são imediatamente incorporadas por alguns executivos ansiosos, cuidadosamente suportados por “consultores” de gestão que cobram em média R$ 180,00 por hora.
São sempre teorias de síntese, em geral teorias lógicas e corretas, mas com densidade e aplicação direta bastante discutíveis e que se baseiam fundamentalmente em elementos de outras teorias já conhecidas.
Essas teorias seriam dispensáveis se nós, empreendedores e gestores, especialmente aqueles de empresas de conhecimento e base tecnológica, observássemos a evolução natural dos negócios, o amadurecimento dos modelos de gestão e a necessidade óbvia de mudar sempre para sermos cada vez mais competitivos e sobreviver. Darwin, lá por volta de 1850, já dizia que “os cientistas deveriam observar mais e pensar menos” — acho que os empreendedores também.
O “formulismo corporativo” move, com muito mais barulho do que o necessário, uma indústria internacional de livros, cursos, DVDs, artigos, podcasts (moderno, não?) e , lógico, horas e horas de consultoria. Depois de alguns anos deixam no seu rastro muito mais problemas do que soluções.
Nas últimas duas décadas já sobrevivemos à qualidade total, à re-engenharia, às certificações ISO, aos mestres de auto-ajuda, às teorias de encantamento (meu deus, as Lojas Renner ainda têm encantômetros (sic) na entrada de suas unidades !!!) e tantas outras “revoluções” no mundo dos negócios.
Adoro uma piada do final da década de 80 que era muita conhecida nas empresas em São Paulo e que traduzia um pouco desse espírito. A história versava sobre o último desejo de três executivos; um francês, um japonês e outro, obviamente, brasileiro, todos condenados à pena de morte por um júri internacional.
Enquanto o francês desejava uma noite de luxúria regada a champanhe e mulheres lindas, o japonês queria fazer uma última apresentação sobre qualidade total utilizando os mais modernos recursos de multimídia para uma audiência de no mínimo 500 pessoas. O brasileiro, coitado, por sua vez, desejava apenas ser executado antes da palestra do japonês!
Sou dessa turma e quero ser executado antes do próximo evento que trate de gerenciamento de projetos baseado nos conhecimentos do PMI (Project Management Institute) ou de BPM (Business Process Management).
Muita calma nessas horas, não pretendo desestimular ninguém em busca do seu certificado PMI ou disposto a investir em ferramentas de BPM. Só me irrito com o funcionamento dessa “indústria” que promove os “formulismos corporativos” como se fossem ovos de colombo e com a idéia de que sua adoção pode ser solução para qualquer empresa que esteja questionando seu modelo de negócios, gestão ou operação.
Em geral, os “formulismos corporativos” simplesmente formalizam tendências, indicam o óbvio e não irão salvar empresa alguma. Só para vocês terem uma idéia, em 1986 me formei em Engenharia, e minha monografia foi sobre redes PERT e suas aplicações no gerenciamento de projetos. Bem antes disso, inúmeras empresas já desenvolviam com sucesso conceitos, metodologias e ferramental para o gerenciamento eficaz de projetos.
Aliás, na empresa que presido trabalhamos há bastante tempo e muito forte no gerenciamento de projetos e processos, mas estudamos e aplicamos todos os conceitos dentro de uma contextualização que valoriza o potencial interno e a cultura da nossa organização. Em tese, criamos os nossos próprios “formulismos”, evitando consumir de chofre o que essa “indústria” absolutamente generalista oferece como opção empacotada.
A propósito, atento às evoluções do gerenciamento de projeto, duas coisas me surpreenderam bastante no ano que passou.
A primeira é ver empresas de desenvolvimento de projetos desmanchando seus PMOs (Project Management Oficcers), depois de investirem milhares de dólares na “projetização radical” de suas estruturas, ao mesmo tempo em que empresas do varejo ou financeiras, por exemplo, exigiam certificação PMI de seus profissionais e encaminhavam a montagem de seus “escritórios de projetos”. Por favor gente.., menos..., muito menos!!!
A segunda coisa que me espantou é a supervalorização pontual, temporária e injustificada de profissionais, e sobre esse tema (e para finalizar, prometo!) acho oportuno adaptar uma outra historiazinha corporativa, essa já bem mais recente, que até poderia estar nas tirinhas do Dilbert:
Um profissional, candidato a gerente de projetos, com apenas dois anos de experiência na função é pré-selecionado em um processo rigoroso de seleção de uma empresa de serviços. Recebe o seguinte questionamento do seu entrevistador:
– Agora que você esta pré-selecionado, gostaríamos de saber qual é a sua expectativa salarial para o posto de gerente de projetos.
Sem titubear, o candidato lasca:
– Sou certificado PMI, tenho alguns anos de experiência, minha expectativa é de um contrato de trabalho (CLT) de pelo menos R$ 10.000,00 por mês, durante o primeiro ano. Mas, primeiramente, gostaria de saber quais seriam exatamente os benefícios adicionais que sua empresa oferece?
Com muita tranqüilidade, o entrevistador responde:
– Bom, nós somos bastante conhecidos pela qualidade dos benefícios que disponibilizamos aos nossos colaboradores. Oferecemos um extensivo plano de benefícios, que inclui, entre outras coisas: 16 salários anuais, vale-refeição de R$ 20,00, o melhor plano médico e odontológico de empresas de serviços de tecnologia, seguros de vida e acidentes pessoais, férias de 6 semanas a cada ano, plano de previdência privada, carro 0 km a cada dois anos para todos os gerentes e diretores, auxílio-moradia para colaboradores de outras praças, além de diversos convênios com farmácias e prestadores de serviços na região.
Nosso candidato, bastante surpreso, comenta:
– Puxa, você deve estar brincando!
O entrevistador, sem mudar a expressão, finaliza:
– Adivinhou, mas foi você que começou.
[Webinsider] Por Cesar Paz
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